A calçada da Rua de Santo António, encomendada pela Câmara Municipal de Faro, ao Mestre Américo, calceteiro de Setúbal, nos anos 60, está a gerar controvérsia entre os intelectuais da cidade.
A primeira coisa que de deve referir é que a calçada em questão é “artística” e não portuguesa.
A calçada portuguesa é herdeira das pavimentações romanas e a expressão portuguesa dessa tradição. Surgiu por volta de 1500 pela mão do Rei D. Manuel I embora os desenhos geométricos conhecidos na atualidade, com pedra escura e branca, tenham sido implementados só em 1842.
O conceito de pavimentação está aliado a uma certa mentalidade romântica, onde se afirma o valor do nacionalismo, que se vai expressar na busca do passado de signos, fatos e mitos considerados marcos fundamentais da história de Portugal e da construção da identidade nacional.
São utilizados por isso na calçada portuguesa padrões e elementos decorativos tipicamente portugueses, relacionados com atividades sócio-económicas, peixes, frutos, cereais, animais, artesanato e sobretudo o período dos Descobrimentos marítimos onde pontificam caravelas, sereias, cordas, conchas, ondas do mar, estrelas e esferas armilares.
Em Faro, a primeira calçada foi construída no jardim Manuel Bivar, no início do séc. XX. A autoria do desenho coube ao ilustre pintor e pedagogo farense Carlos Augusto Lister Franco.
Há cerca de 40 anos a rua de Santo António foi empedrada com um revestimento de extrema riqueza e complexidade e que se tornou num dos ex-líbris da cidade.
No entanto esse estatuto não tem chamado a si uma verdadeira interpretação dos desenhos que lá se escondem. Desenhos que passam desapercebidos à maioria das pessoas que a usam no seu dia-a-dia.
Para a elaboração da calçada o Mestre Américo e a sua equipa seguiram os moldes desenhados pelo Arquiteto Ramires Fernandes, no entanto, ao preencherem os lírios vermelhos, ocultaram no seu interior símbolos maçónicos, a Cruz de Cristo, a foice e o martelo símbolo do comunismo internacional, a Estrela de David.
Há quem atribua a estes desenhos à simples vontade do mestre Américo de embelezar os lírios, em muitos dos quais se encontram variações de flores.
Outras pessoas encontram na atitude do calceteiro uma forma muito clara de contornar a censura do Estado Novo. Os calceteiros eram dos mais ativos elementos contra o regime. Na maior parte dos casos militavam no Partido Comunista e em grupos da oposição.
Por outro lado há quem considere que os símbolos têm uma leitura mais profunda. Atribuem-nos a influências da maçonaria. O Olho Maçónico e a Cruz de David apontam nesse sentido.
De que outra forma se podem atribuir estes símbolos a um humilde mestre calceteiro senão por força de uma “Ordem” maior?
Realidade ou ficção a calçada da Rua de Santo António pede um estudo interpretativo e é merecedora de uma memória explicativa para quem lá passa.
Comentários
Enviar um comentário